quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Campanha: Não à medicalização da vida, medicalização da educação

Campanha do Conselho Federal de Psicologia alerta para o uso excessivo de remédios no tratamento de distúrbios e déficits de aprendizagem.



A situação é alarmante: entre 2010 e 2011, a venda do medicamento metilfenidato, substância química usada para tratar o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade sumiu de 70 mil caixas por ano para 2 milhões!!! de caixas.
Nosso país atualmente ocupa nada menos que o segundo lugar no ranking dos maiores consumidores da droga no mundo.
Diante da situação, meu sentimento é de profunda tristeza, inclusive revolta, num misto de compreensão da situação. Sim, porque não há nada mais fácil às escolas brasileiras, aos professores de alunos que se destacam negativamente diante da média esperada e também aos pais, do que exteriorizar o problema: transferi-lo, assim como sua solução, à um agente externo, que hipoteticamente não existe por resultado da ação disto ou daquilo, ou do conjunto em que a criança está inserida.
Fácil supor e acreditar cegamente, a ponto de submeter crianças ao uso de drogas que inclusive podem causar dependência, além de alterar seu estado de espírito original e sua personalidade, que o motivo da falta de interesse dentro de sala de aula é uma doença, um distúrbio psicológico/psiquiátrico.
Professores de hoje em dia não sabem lidar com uma sala de aula mista, em que alguns alunos lógica e naturalmente terão maiores dificuldades que os demais. Diante da situação, não se têm um olhar crítico, não se questiona sobre a própria postura, ou sobre a bagagem do aluno, pois isto possivelmente levaria a uma necessidade de mudança ou à mínima atitude para mudar, algo que exige que se demande energia, além de despertar inicialmente sentimentos de fracasso, derrota ou impotência.
Aos pais, é certamente incômodo medicar seu filho por conta de uma "deficiência", ou um de "probleminha psicológico", mas muitas vezes é considerado mais fácil transferir a responsabilidade do controle da situação aos médicos, ou à própria criança, ou à escola, etc, do que pensar que a sua falta de tempo de qualidade com seu filho pode estar acarretando nessa tentativa de chamar a atenção.
Conheço casos de pessoas adultas, que relembrando seus momentos de criança e dificuldades de comportamento em sala de aula, maus resultados de aprendizado, mencionam que quando sua mãe ia à escola, convocada pela gestão da escola, se sentia amada, se sentia querida. Talvez fosse um dos únicos momentos em que essa mãe dedicava tempo à seu filho ou à assuntos referentes à ele.
A questão é que não é possível que 2 milhões de caixas de remédios para tratamento psicológicos sejam utilizadas em crianças no nosso Brasil! Trabalho em escola, trabalho há anos com crianças, e não posso acreditar que uma parcela muito grande delas necessita da administração de drogas fortes de uso contínuo.
Como professora particular de reforço e acompanhamento escolar, já recebi pais que queixavam-se de suspeitar que seu filho tivesse alguma deficiência de aprendizado, e que inclusive tiveram essa indicação da própria escola, e ao conhecer a acompanhar corretamente o aluno, percebo que suas dificuldades são decorrentes da simples falta de atenção, ou da baixa autoestima, da crença de sua impotência, ou ainda da não motivação para aprender x ou y.
Crianças que não vêem motivo para aprender, não aprender, não querem aprender. Partem ao "plano B": bagunçar, farrear, brincar...
Professores, não rotulem seus alunos, acreditem neles! Acreditem no potencial e no poder do seu trabalho! Moldem, ensinem, conversem, compreendam, ajudem!
Pais, atenção aos seus filhos! Conversem sobre a rotina, escutem as queixas, acompanhem os estudos, as lições de casa, permitem que brinquem, que gastem energia e brinquem com eles!
Chega do abuso à medicamentos controlados por crianças! É um ranking em que não deveríamos ocupar a segunda posição! Não queremos essa posição!

Para conhecerem melhor sobre o assunto e sobre a Campanha NÃO À MEDICALIZAÇÃO DA VIDA, MEDICALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO, acesse o site a seguir:

Divulgue a campanha em sua escola, do seu bairro, repasse aos pais dos colegas de seus filhos!
Não fique parado!

Sugestão de leitura sobre o tema:

A Institucionalização Invisível: Crianças que não aprendem na escola - Maria A. Affonso Moyses, Editora Mercado de Letras

O livro fala sobre a história de um trabalho com setenta e cinco crianças que não aprendem na escola, em que se reconstrói a história das formas de vigiar, castigar e punir, além do próprio processo de institucionalização a que são submetidas, tornadas incapazes de aprender e incorporando fracassos e doenças não existentes, imputadas.
Vale a pena!